Lula
[caption id="attachment_668" align="alignnone" width="2000"] Crédito: Ricardo Stuckert[/caption]De Portugal diziam-me (ao ver as imagens de Lula em S. Bernardo do Campo) que, nos próximos dias, talvez fosse melhor ficar no flat. Comprar alguma comida, não ir à rua, e trabalhar aqui a partir do meu pequeno mundo paulista. Confesso que nunca senti essa necessidade...S. Paulo, em si, estava, e está calma. Sendo um reduto forte anti-PT, todas as pessoas com que falava apenas viam uma saída: a invasão do edíficio do Sindicato dos Metalúrgicos pela Polícia Federal, para executar o mandato de Sérgio Moro. Mas, na prática, a vida continuava calma, e mesmo que em alguns pontos surgissem manifestações, esta zona decididamente não seria uma delas. É certo que o tema povoava as conversas, mas, nas ruas, estas eram apenas povoadas pelas pessoas que dia após dia vão vivendo ou sobrevivendo, num país que realmente é muito sui generis politicamente. Não me senti (e não me sinto) inseguro.
Ainda assim, estímulos não faltariam para algum fenómeno mais generalizado. Um pouco movidos por alguns acontecimentos mais infelizes de violência pontual, mais fora da Grande São Paulo, alguns canais (como a Band) basicamente crucificaram Lula e o PT, de uma forma que não estamos de todo habituados em Portugal, um país onde as tendências políticas da comunicação social começam agora a estar ainda mais bem definidas. Dir-se-ia que, num país como o Brasil, a agressividade da mensagem quase que deixava a entrever um certo fomentar de maiores movimentações, de consequências indefinidas. Um discurso muito polarizado que, ainda assim, não passou de catalisador de discussões de almoço ou de café da manhã. Talvez porque se sentia (e sente) aqui em S.Paulo que só existiria uma solução para este problema, e ela seria inevitável. Mas é também nestas situações que se sente o estrago que este discurso polarizado provoca quando prolongado no tempo numa sociedade sem esperança...sim, a Polícia Federal deveria invadir o edifício, independentemente das pessoas que tombassem nessa operação. E esse ressentimento também se sentia nas conversas de almoço e de café da manhã...E é esse ressentimento silencioso e prolongado, despertando de forma quase convulsiva numa qualquer rutura do tempo que preocupa. Estes dois dias, ele não surgiu. Mas no futuro, o ambiente existe para que ele possa surgir.
Quando escrevo este post, Lula já se entregou, e a Polícia Federal, embora com algumas dificuldades em sair do edifício, conseguiu retirá-lo. Nada de muito inesperado, com algumas grades a serem arremessadas por entre palavras mais violentas, sentidas, exaltadas. Não condeno as pessoas que estiveram em S. Bernardo do Campo para o defender...não cabendo a mim a decisão sobre se Lula é ou não culpado, reconheço que, durante o seu mandato presidencial, todas aquelas pessoas sentiram verdadeiramente uma esperança. No cenário contrário, muitas pessoas o acusam de apenas ter virado ao contrário o sinal da velha política brasileiras de interesses, o que causa muitos sentimentos negativos nos conjuntos políticos nos antípodas do PT...não me cabe a mim decidir...será, contudo, este Brasil extraordinariamente polarizado que irá às urnas em Outubro, apenas com a única certeza de que nenhum dos nomes em presença reúne um capital de confiança capaz de mobilizar o país no rumo da mudança desejada. Por entre táxis e Ubers, oiço que uma das soluções seria o exército tomar o poder, apenas para fazer uma limpeza nas instituições, permitindo surgir esse nome. Por agora, não me parece que o exército esteja unido em torno desta ideia, até pelo passado histórico que protagonizou (ao contrário da sociedade portuguesa, a História aqui ainda é algo que é valorizado). Veremos o que nos traz este futuro a este país do qual genuinamente gosto, onde me sinto bem e onde sou respeitado, e onde, apesar de tudo, na esperança tão típica deste povo, se respira futuro.