Não gosto de saudosismos. Nunca gostei, e da vivência no passado apenas guardo a memória de não evoluir. Gosto, contudo, de falar do passado, porque dessa viagem nascem grandes lições para o caminho, de como o pé sabe acariciar o chão, lançando o próximo passo no universo.
Mas hoje, mais um aniversário passou. Mais um dia, mais um passo. Mais um silêncio encontrado nos horizontes que nele se abrem...presente que se recusa tornar passado, que insiste em tornar-se futuro.
És feito de um tempo que se renova, senhor de um futuro que apenas no teu silêncio constróis.
[caption id="attachment_123" align="alignnone" width="1024"] Credit: Space X[/caption]
Como todo o mundo, assisti com um misto de admiração e alegria ao lançamento do Falcon Heavy. Numa ótica mais pessoal, juntou-se a este sentimento um certo revivalismo de alguém que sempre gostou muito de astronomia e da ciência astronáutica, e que sentia, desde o final da guerra fria e de alguns lançamentos ocasionais, falta desse imaginário infanto-juvenil, relacionado com a exploração espacial, preso num certo cinzentismo de uma rotina automática e circular em que a mesma se foi tornando. Não que ela não nos trouxesse a magia de cada vez melhor conhecermos a nossa real dimensão no universo (assim como a real consciência da mesma) mas...faltava algo.
Com o Falcon Heavy, a magia da exploração espacial renasceu. E por entre um ambiente geopolítico que evoca a dinâmica de blocos da guerra fria, onde nasceu e se desenvolveu num imemorial primeiro capítulo, renasce simbolizada do eterno Major Tom, o ícone da canção de Bowie...sim, oficialmente chama-se Starman, mas prefiro pensar que é o Major Tom que navega no espaço, transportando em si toda uma nova iconografia baseada no homem em vez do estado, na humanidade em vez do grupo, na conexão em vez dos conectados...a sua nave espacial já não é um símbolo de uma competição, mas de um engenho que mais que a visão de engenho humano e social de Elon Musk, transporta para o espaço o nome de um dos maiores génios que a humanidade, em toda a sua história, alguma vez conheceu, unidos por uma visão diferente, e alternativa do ser humano...Musk ao nível mundo, Tesla ao nível da eternidade.
Voltando à visão pessoal, o Falcon Heavy é também um símbolo de solidão, não com o significado mercantilista dos dias que correm, mas com a capacidade de interiormente discernir o que de mais vasto existe em nós, independentemente da distância e libertos dos grilhões do tempo...de que ainda vale a pena pensar o mundo e a humanidade no contexto da sua história, das lições aprendidas e dos horizontes alcançados por entre as pregas do espaço-tempo. Não sei se o Major Tom pensa nestas coisas no seu caminho para Marte. Gosto de pensar que sim, e de acreditar que quem nos guia pelo espaço nos mostra, de uma forma nova, o universo que todos nós vemos, o universo que desde sempre vive em nós.
Omnia in Unum representa o princípio da unicidade. Um princípio que se torna uma sensação quase física quando, ao olharmos à nossa volta, sentimos que tudo no universo se movimenta de uma forma síncrona, sem tempo ou espaço senão aquele que em nós vive, e que se espelha nesse quadro perpétuo que se estende à nossa volta.
É igualmente o princípio da nossa própria existência. Ao longo da história da humanidade, o que fazemos, criamos ou destruímos, define-nos de uma forma diária, construindo-nos como a soma de todas as vitórias e derrotas, alegrias e tristezas, determinação ou medo. A soma que ao longo do tempo se vai tornando uma encruzilhada, numa humanidade que esquece a sua própria história para se redefinir num loop contínuo de vazio. Uma eterna escolha, tão antiga quanto o tempo, que de uma forma tão direta quanto ausente ousamos permanentemente adiar, na alvorada de um novo tempo.
É também a forma como nos revemos no que fazemos, vemos, ouvimos, lemos. Como ponto consciente de um universo que baila à nossa volta, ou como expressão máxima de uma humanidade que navega na alegoria dos seus nadas, navegamos por entre o dia e a noite, o profissional e o pessoal, o nosso grande o grupo e o nosso mundo cada vez mais pequeno, enquanto a seta do tempo desfila à nossa volta, moldando-nos sem o percebermos, iludidos em sonhos de grandes mudanças, e perdendo a visão da mudança que em nós mesmos estamos destinados a realizar, na grandiosidade do ser humano que desde a sua origem é condenado a evoluir, e a evoluir-se.
Omnia in Unum é, assim, tudo sobre nada e nada sobre tudo. No ponto de contacto entre essas realidades, encontro-me eu. Estas são as minhas palavras e as minhas imagens... convido-te a esquecê-las.